quinta-feira, 16 de setembro de 2010




O Imigrante





Eis que um dia acordou ouriçado
E os dias de aldeia não serviam-lhe mais.
o ar puro do campo, não era de todo suficiente para alimentar os pulmões,
e as batatas colhidas, não saciavam-lhe a fome
Fome de mundo,
de colher cada novidade nos calos rudes das mãos...

Acordou neste dia para nunca mais dormir em solo natal
me pergunto se chorou...ou agoniou-se, se sentiu falta das coisas que estava a deixar em um mar de distancia. Provavelmente não...não era homem de arrependimentos...pelo menos não aparentava ser. Ao acordar, já não era mais bicho dali. Sua nacionalidade havia sido perdida em meio ao sono e ao abrir de seus olhos era um ser sem pátria, tomado pelo anseio de navegar ao novo...

este sonho contaminou outros sonhadores,
todos pareciam estar compromissados com o desconhecido, de certo o bicho que mordeu um, mordeu outro e nos olhos de todos brilhava o mesmo sonho rustico, de ter o mundo aparado nos braços firmes, rasgando a foice cega, as maledicências que os esperavam no lado de lá...se é que havia um lado de lá...ninguem sabia

muito não demorou...
o sol mal inaugurava o dia, e já podiam ser avistadas as enormes filas rumo ao cais,
longas e ressabiadas serpentes arrastando-se na mesma senda.

E assim estendeu-se a manhã...

Não demandava esforço, bastava mirar no semblante do monstro coletivo e notava-se: eram homens envelhecidos, de mandíbulas rígidas e olhos fundos, que um após outro formavam um mar de criaturas grosseiras, queimadas pelo inverno, curtidas ao sol de outros verões. Não era uma boa visão e isto não ha como negar, mas pergunto-lhes, neste período, quais não partilhavam do mesmo semblante escurecido?         
Diante da fome, todos tinham a mesma face, a mesma dor. Os estômagos vazios sugavam-lhes os nutrientes da pele, que em pouco tempo, tornavam-se capas de couro morto que forravam os rostos e os corpos destes futuros estrangeiros.
Mas apesar disto, era impossível duvidar da decência de seus sonhos... quem deseja prosperar a trabalho deve ser respeitado até a lapide e mesmo em devaneios, deve ter seu nome honrado...e eu jamais cometeria o erro de não o fazer, por isso descrevo com cuidado esta historia que ouvi a alguns anos que perdi na conta e com respeito hei algum dia de termina-la...




                           








                            

"Partir é quase morrer.
                        Pode ser pra nunca mais:
                        Dentro do peito a bater
                        Um sino toca a sinais.




                        Ir no vapor, embarcar…
                        Custa pouco, vai depressa;
                        Mas a saudade é um Mar,
                                 E esse nunca se atravessa!..."
(Jaime Cortesão)

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